segunda-feira, 2 de novembro de 2020

NÃO SOU FEMINISTA LIBERAL!

 Ah, o patriarcado...

Imagem disponível em:https://medium.com/qg-feminista/o-que-%C3%A9-esse-tal-de-feminismo-liberal-12c2c28e4b37

    Meu primeiro contato com a literatura Feminista ocorreu na adolescência, por volta dos 14 anos. Naquela época eu tinha uma vaga noção de que as mulheres eram tratadas de forma diferentes dos homens através de observações do cotidiano. Desde de regras familiares de comportamentos para meninas até aquelas revistas de alta circulação ( oi, Capricho), nada escapava da minha percepção. 

Eu fui bombardeada com informações de que mulher tinha que estudar, trabalhar, ter sua carreira, ter um carro, seguir uma carreira… Tudo que as nossas antecessores não tiveram oportunidades de usufruir e me parecia um bom caminho até… descobrir que a sociedade é bem mais complexa.

    O Feminismo assim como outras teorias tem várias vertentes: o Feminismo Radical, o Feminismo Marxista, o Feminismo Liberal, o Feminismo Negro… O que mais influencia hoje certamente é o Liberal, e certamente é o mais problemático também. E por quê?

O Feminismo Liberal considera a liberdade um valor maior que a igualdade. Porém, vivemos em sociedade e temos relações contraditórias com… Bom, com todas as pessoas. O Feminismo Liberal não leva em consideração a estrutura econômica da sociedade, o que significa que a liberdade vai até a página 2. Ou seja, você pode trabalhar e se esforçar mas há muitas forças de interesses ao lado e acima de você e que se você não se atentar, até a sua "liberdade" pode ser usada contra você. 

    Um simples exemplo é a liberdade sexual. Hoje em dia, um homem não pode mais anular um casamento pelo fato da mulher não ser mais virgem, porém, ainda temos um padrão moral ambíguo em que a mulher é condenada socialmente se ela tiver o mesmo comportamento que o homem. Parece que mudamos, pero no mucho né? Isso porque a história é marcada por avanços e retrocessos, tanto culturalmente quanto economicamente. 

    Não existe liberdade absoluta e mesmo que você decida se enfiar em uma ilha e fazer só do seu jeito a sociedade continuará aí com as suas contradições. 

Você pode fazer sua parte para mudar o mundo, mas sem um propósito para o coletivo até suas conquistas podem ser usadas contra você… Bora se mexer, mas sem se iludir com meritocracia 😂.

sábado, 31 de outubro de 2020

Feliz dia das Bruxas?

 " A caça às bruxas foi, portanto, uma guerra contra as mulheres; foi uma tentativa coordenada de degradá-las de demonizá-las e de destruir seu poder social. Ao mesmo tempo, foi precisamente nas câmaras de tortura e nas fogueiras onde se forjaram os ideias burgueses de feminilidade e domesticidade"

Calibã e a Bruxa, editora Elefante

    Você já se perguntou de onde vem aquela mentalidade de que o homem é sempre a vítima da sedução feminina? Aquela velha história de pulada de cerca em que sempre aparece alguém para dizer que homem é homem e que cabe a mulher impor limites? Você já viu alguém justificar alguma traição feminina apenas por uma mulher ser mulher? Obviamente que não. Mas, de onde vem essa concepção da mulher diabólica que sempre tem o poder de seduzir e levar o homem a perdição?

Silvia Frederici aponta no livro Calibã e a Bruxa que a caça às bruxas foi historicamente um dos acontecimentos mais importantes que auxiliou no desenvolvimento da sociedade capitalista. E por quê? Porque ao propagar o terror dos homens em relação às mulheres , aprofundou-se a divisão entre eles e permitiu que se houvesse um maior controle sobre os camponeses. 

    Combater " as bruxas" era combater também tudo que contrariava a disciplina do trabalho, já que elas representavam um corpo rebelde dentro da sociedade.

Geralmente, as bruxas eram curandeiras, parteiras e mulheres com conhecimento de ervas e uma das primeiras formas de controle sobre o corpo da mulher foi justamente retirar as parteiras durante os nascimentos, o que também refletiu no aumento de mortes. 

Cada povo da Europa teve sua versão de caça às bruxas e contou com o apoio da Igreja Católica, principalmente reforçado pelo pecado ter vindo ao mundo através de Eva. 

    O objetivo aqui é mostrar que essa mistura de misticismo com religiosidade foi a combinação perfeita para se reforçar a exploração sobre as mulheres. 

No fim, toda bruxa é uma mulher que desafia o status quo. Nunca se esqueçam disso.




sexta-feira, 30 de outubro de 2020

Ideologia de gênero: sobre algo que não existe e baboseiras pós-modernas

O único resquício de Ideologia aqui são as cores rosa e azul...



    Bom, provavelmente você já ouviu falar em Ideologia de Gênero. Talvez você não saiba que esse é um debate mais antigo do que se imagina: os gregos já falavam sobre almas femininas, almas masculinas e hermafroditas ( ah, os idealistas...) e consideravam como padrão ideal ser hermafrodita e usufruir o melhor dos dois mundos.

 Bom, há uma diferença entre sexo biológico e gênero. O sexo feminino e masculino são determinações biológicas, porém, o gênero e o que consideramos como feminilidade e masculinidade estão no campo da cultura.

    Você poderia imaginar que na natureza seja mais fácil, porém é justamente ela que traz algumas surpresas, como espécies com comportamentos homossexuais, espécies trocando de sexo e machos carregando os filhotes. 

    O ser humano tem o diferencial de refletir sobre o que faz a ponto de que até a estrutura de trabalho de nossa espécie é diferente de outros animais que agem apenas por instintos ( até o ponto que sabemos). 

    A "Ideologia de Gênero" é o novo espantalho do nosso século. As pessoas tratam de uma forma como se fosse possível impor orientação sexual ou convencer a pessoa que ela é do sexo oposto. Na verdade, nós já vivemos padrões de comportamentos que beiram uma Ideologia. Afinal, quem determinou que rosa é cor de menina e azul é cor de menino? Não sabemos mas isso passou pela convenção social, assim como para nós o preto é a cor do luto mas para alguns povos do Oriente Médio é o branco.

    Ideologia de Gênero simplesmente non ecziste, é apenas uma desculpa para pessoas que têm dificuldades em compreender a complexidade da sexualidade humana. 



quinta-feira, 29 de outubro de 2020

O problema da Educação no Brasil é Paulo Freire?



Nessas horas o velho deve estar se revirando no túmulo...




    Antes de entrar no curso de Pegagogia ganhei de um primo muito querido o livro Pedagogia da Autonomia. Um livro que só fui entender muito tempo depois, até porque ao contrário do dizem os combatentes da "doutrinação esquerdista" não passamos 4 anos ajoelhando e venerando Paulo Freire, pelo contrário, no meio acadêmico há inclusive críticas, como em relação a TODOS outros teóricos/filósofos.

    Paulo Freire criou um método de alfabetização de ADULTOS, foi reconhecido mundialmente e recebeu o título de Patrono da Educação. Apesar de tudo, a escola nunca deixou de ter uma estrutura POSITIVISTA, aquela coisa de conhecimentos separados e hierarquizados. Então, de que buraco surgiu a concepção de que a escola é freiriana?

    Lembro- me de uma vez que vi Danilo Gentili criticar Paulo Freire ( parece piada né?) e perguntaram o que ele não concordava com o filósofo e ele disse " aquele negócio de Ivo viu a uva". Bom, qualquer estudante mediano sabe que essa frase dentro do livro era justamente uma CRÍTICA de Paulo Freire sobre o método de se ensinar através da repetição de letras descontextualizados...

    O grande problema não é apenas Danilo Gentili pensar assim: é encontrar a reprodução de críticas vazias o tempo todo nas internetês da vida. 

Quando se puxa o fio condutor descobre que na verdade o problema é ele ter admiração por ideias marxistas, o que, a priori não é problema algum, pelo contrário, o materialismo-histórico é um MÉTODO VIVO e não mera doutrinação, tanto que agora estamos vivendo uma fase de retrocessos ...

    O problema da Educação é e sempre foi a tendência ao desmonte estrutural e ao sucateamento. Afinal, é sempre mais fácil encontrar saídas através do discurso moralista do que pensar em como ter um bom espaço para o estudo, professores bem remunerados e acompanhados em seus problemas psíquicos, métodos de avaliação que não induzem ao rebaixamento do nível de ensino, a assistência de crianças desamparadas... A Educação é um campo de problemas complexos que exigem articulações eficazes. 

    Em vez de acusar Paulo Freire daquilo que não se sabe é melhor seguir aquela velha e boa dica : estudar de verdade.

quarta-feira, 28 de outubro de 2020

Mulheres são privilegiadas?

Ah, os privilégios...

    Você já deve ter ouvido sobre as benesses de ser mulher: não precisa se alistar no Exército, não precisa abrir estradas, são alvos preferenciais de campanhas de saúde, recebem mais do que homens na indústria pornográfica ( rsrsrs) etc. Geralmente essa imagem de privilégio parte do imaginário de homens ressentidos que consideram que a mulher tem mais oportunidades de saracutiar ( leia-se " pegar quantos homens quiser") por aí apenas por ter uma vagina.

    Mas você já se perguntou o quanto o que parece privilégio esconde uma camada de exploração? 

Pense no casos das guerras. Quando os homens partiam para lutar ( por conflitos criados por homens) as mulheres ficavam em casa para garantir a manutenção da família, o que provavelmente resultava em um aumento do trabalho doméstico para manter os filhos. As meninas dentro desse contexto são alvos preferenciais de inimigos, todo histórico de guerra carrega consigo casos de estupro coletivo e humilhação de mulheres pelos homens. Isso é privilégio?

    As campanhas de saúde são voltadas para mulheres justamente porque elas são as que mais se preocupam em marcar exames para si e seus companheiros, já que a masculinidade tóxica não permite ao homem se mostrar frágil.

Mulheres são as que mais procuram auxílio psicológico/ psiquiátrico, justamente porque internalizam desde cedo as funções de cuidados.

    Já em relação a indústria pornográfica… Bom, nem é necessário enfatizar que ela é uma indústria de homens voltadas para homens né? O que uma atriz desse ramo ganha em um período, a indústria ganha no mínimo 10 vezes mais com relançamentos. Isso sem falar nas promessas que recebem de seguir outra carreira depois e acabam não conseguindo sair sem pagar um preço muito alto.


Sim, esse livro existe e sim, leiam. Dialética tá aí para isso!


    Já notaram que o que chamam de privilégio na verdade é exploração romantizada né? No próximo post falarei mais sobre isso, e trarei referências bibliográficas. Aguardem!


terça-feira, 27 de outubro de 2020

O antifeminismo nas redes e o que isso diz sobre nós






    Lembro-me da primeira vez em que me deparei com páginas antifeministas no Facebook e do quanto fiquei chocada com o que lia nos posts e comentários. A forma curiosa de como se consideravam crítica dos movimentos me fez acompanhar por longo tempo para descobrir o que realmente combatiam ao direcionar toda a raiva para o feminismo e não para o machismo.

Quando você agarra o fio de Ariadne você finalmente descobre que por trás do Antifeminismo há um combo: a mistura de pautas reacionárias, religiosas e até "olavetes". 

Geralmente, os grupos erguem algum espantalho, como aquelas manifestações de seios de fora e todo tipo de gente pelada, batem nele, acusam de seguir alguma cartilha comunista e o debate raramente ultrapassa a superfície ( pseudo) moralista.

O mais curioso de tudo é que no meio de tanta distorção teórica, o que mais criticam é o Feminismo Liberal ( que também é renegado pelo Feminismo Marxista) ao mesmo tempo em que seguem ele sob a direção da paranóia anticomunista.

    Quem nunca viu uma antifeminista que trabalha fora, segue carreira universitária e /ou política enquanto diz que não precisa do Feminismo?

O antifeminismo alega que nós mulheres somos privilegiadas por não sermos obrigadas a nos alistarmos ao Exército, a realizar trabalhos pesados ligados `a construção civil, a correr riscos em profissões perigosas, contudo, se esquecem que meninas são comumente feitas de escravas sexuais, que muitas mulheres se submetem a trabalhos menos remunerados para sustentarem uma família e que muitas ainda estão em dilemas relacionados à dupla jornada ( ou tripla) jornada de trabalho.

Uma das maiores preocupações do Antifeminismo é a emasculação dos homens , já que acreditam que os avanços sociais das mulheres os intimidam e inibem o " instinto de proteção" masculina. E toda essa preocupação por quê? Porque isso afeta a relação de homens e mulheres, acaba com o "romantismo", acaba com possíveis provedores financeiros... Ou seja, o Feminismo atrapalha que as mulheres continuem se moldando para agradar a auto-imagem de herói dos homens.

Uma das principais acusações sem a devida fundamentação é de que o Feminismo NEGA as diferenças biológicas, quando na verdade o que mais se aproxima disso é o Feminismo Liberal rsrs. A maior parte das vertentes leva em consideração de que as diferenças biológicas contribuíram direta e indiretamente para a inferiorização social da mulher, porém , não há uma culpabilização da natureza quanto a isso e isso uma reflexão do quanto podemos criar uma sociedade que leve em consideração a superação do determinismo biológico.

A disseminação das ideias antifeministas nas redes se deve ao fato de que elas nunca estão dissociadas de outros elementos mais palatáveis que exigem menos reflexão.

Pensar em um modelo de sociedade em que as diferenças são respeitadas quando precisamos ser diferentes e sermos reconhecidos como iguais quando devidamente precisamos ser vistos dessa forma exige muito mais do que indagações superficiais e respostas simplórias.

    Apenas para citar um exemplo: a questão da gravidez e o mercado de trabalho. Olhando apenas para questão biológica, sabemos que essa diferença entre homens e mulheres geram a preferência por homens em muitos cargos. Nesse aspecto tivemos o avanço de ser ter licença-maternidade para que a mulher possa se dedicar exclusivamente ao filho nos primeiros meses. Essa diferença impõe uma necessidade diferente para as mulheres, porém, a discussão gira sempre em torno do empresário/empregador ser prejudicado ao selecionar mulheres. E por que isso acontece? Porque em nossa estrutura econômica já deixamos há muito tempo de priorizar o ser humano, ele se tornou apenas meio e não finalidade, logo, a primeira preocupação sempre será com lucro, retorno monetário e afins.  Logo, é mais fácil culpar as mulheres por engravidaram e recorrer a um discurso de que "tudo é questão de escolha" , como serter filhos fosse APENAS um dilema individual, quando o simples fato de se viver em sociedade já nos coloca automaticamente em escolhas que sempre se confrontarão ou refletirão no COLETIVO.

    Historicamente já temos um exemplo de que ter ou não filhos tem um impacto que afeta o coletivo. Lembram da Política do Filho Único que a China adotou para controlar o crescimento populacional? O resultado foi simplesmente preocupante. Por se tratar de uma sociedade ainda com forte resquício patriarcal a preferência era se se ter apenas um filho do sexo masculino, já que na cultura deles é o filho homem que tem obrigação de cuidar dos pais na velhice enquanto as filhas passavam a ter a obrigação de cuidar da família do marido. Com isso, houve um crescimento alarmante de abortos de bebês do sexo feminino e os países em atritos com a China passaram a ter a preocupação de lidar com milhões de homens solteiros que não encontrarão uma mulher para casar ( no caso dos héteros). E o motivo da preocupação? Uma sociedade com mais homens do que mulheres apresenta um índice maior de violência e a tendência a resolver tudo na... bala. ( Em conflitos bélicos nada melhor que arrumar uma guerra para jovens desocupados né?). Para bom entendedor...

    Tudo isso, só para apontar que indagações superficiais, comportamentais e moralistas são fáceis, lidar com a estrutura e as consequências coletivas é que são elas. E é por isso que o Antifeminismo cresceu tanto: porque ele é fácil. O silêncio é que se tornou difícil.





domingo, 25 de outubro de 2020

Calibã e a Bruxa, sobre trabalho doméstico e o que isso tem a ver com Pandemia

 " As mulheres não poderiam ter sido totalmente desvalorizadas enquanto trabalhadoras e privadas de toda a sua autonomia com relação aos homens se não tivessem sido submetidas a um intenso processo de degradação social".


    O livro Calibã e a Bruxa, de Silvia Federici, foi traduzido pelo Coletivo Sycorax e se tornou um dos livros mais marcantes em minha vida: não há como lê-lo e não sair refletindo sobre a vida das mulheres ao nosso redor. Em tempos de Pandemia, chegamos `a conclusão de que o que consideramos avanços sobre o trabalho feminino na realidade são superficiais, ou seja, quando o bicho pega a tão mal-falada divisão sexual do trabalho volta com tudo. Ou você não conhece mulheres que deixaram de produzir conhecimento científico, adiaram projetos e sobrecarregaram com trabalhos home-offices enquanto estavam em casa cuidando da família?

    No livro, Federici aborda a transição do feudalismo para o modo de produção industrial e como boa materialista-histórica aponta as contradições que contribuíram para uma forma indireta de exploração do trabalho feminino. Por se tratar de uma abordagem mais acadêmica, é preciso explicar algumas coisitas para quem quer se inteirar sobre o assunto.

    Primeiramente, é preciso compreender a Teoria da Reprodução Social. A divisão sexual do trabalho poupou as mulheres de alguns tipos de serviços braçais em alguns contextos, porém, ao contrário do que defendem as antifeministas isso não foi um privilégio, já que as mulheres passaram a realizar trabalhos de cuidados que facilitavam a vida homem para ele exercer atividades fora do lar, além de garantir futuros trabalhadores para o "sistema". Manter a mulher dentro do âmbito doméstico e não pagá-la por isso tornou-se um mecanismo conveniente de se ter mão-de-obra mais barata.

    A autora aponta também que a famosa caça às bruxas não passou de uma política sexual que visava a domesticação das mulheres que se rebelavam contra o status dominante e ainda critica Marx por não ter se atentado que a exploração da mulher também foi uma forma de manter as classes dominadas controladas já que mesmo em momentos de libertação do trabalho escravo, a mulher continuava socialmente inferiorizada.

    Através das contradições do capitalismo, que associa o valor do trabalho através do salário, Federeci considera que a subversão é justamente atuar em cima da maior crítica de Marx em relação á relações afetivas terem se tornado meramente monetárias: exigir que donas de casa se tornem assalariadas.

    As mulheres CONTINUAM em desvantagem histórica e não são apenas mudanças superficiais que mudarão isso. 



Você suporta suas próprias contradições?

Parece que petrificamos cedo demais... Como boa leonina, eu sempre me orgulhei de ter ideais fortes, acreditando ou não em arquétipos astrol...